Data é uma oportunidade para reafirmar o papel da leitura na construção de uma sociedade mais justa, plural e informada e foi instituída pela UNESCO para incentivar o hábito da leitura e refletir sobre sua importância cultural e social
Você sabia que 23 de abril é o Dia Mundial do Livro e dos Direitos Autorais? A data, instituída pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) em 1995, ganhou um significado especial neste ano com a escolha do Rio de Janeiro como a primeira cidade brasileira a receber o título de Capital Mundial do Livro. Com o lema “O Rio de Janeiro continua lendo”, a cidade terá a missão de promover atividades culturais que celebrem autores e incentivem a leitura em diferentes territórios e para todas as faixas etárias.
A data também é um lembrete sobre a importância da leitura e da proteção dos direitos dos autores e escritores. A Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma, em seu artigo 27, que “toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria”.
No Brasil, a Lei nº 9.610/1998 regulamenta os direitos autorais, assegurando ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor de sua obra, protegendo também o acesso democrático à produção intelectual. Nesta data tão simbólica, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) reforça a importância dos livros como instrumentos de transformação social, preservação da memória e promoção da dignidade humana.
Memória institucional dos direitos humanos
-
- (Foto: Gabriela Matos/MDHC)
Em um país onde a memória muitas vezes é alvo de tentativas de apagamento, a Biblioteca do MDHC resiste como um território de preservação histórica e disseminação de conhecimento. À frente dessa missão, está Márcia Rocha de Aguiar, bibliotecária que, há anos, se dedica a garantir que a produção técnica e política do Ministério não desapareça.
De acordo com ela, a biblioteca surgiu a partir de um acervo remanescente da antiga Secretaria de Igualdade Racial e foi fortalecida ao longo dos anos por meio de parcerias e de iniciativa interna. “Fui atrás de sistemas, visitei experiências de outras bibliotecas públicas e, com apoio do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), conseguimos estruturar o acervo”, relembra. A bibliotecária também conta sobre iniciativas como o mapeamento de bibliotecas de outros ministérios com assuntos em direitos humanos para promover o intercâmbio de publicações dentro da temática.
A memória é uma pauta transversal no MDHC, que envolve a preservação da história de diferentes períodos, desde a ditadura militar até o período da escravidão, passando pelas lutas contemporâneas das populações vulnerabilizadas. “A biblioteca tem papel central para garantir que essas histórias não sejam apagadas”, afirma Márcia. “A gente precisa desses registros para lembrar o que aconteceu e evitar que os erros se repitam, e nos momentos mais difíceis, a biblioteca se tornou um espaço de acolhimento, resistência e memória”, complementa.
Conheça a Biblioteca Digital do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania
-
- (Foto: Gabriela Matos/MDHC)
Durante a gestão do governo anterior, Márcia enfrentou diversas tentativas de fechamento da biblioteca – uma delas justamente quando organizava publicações sobre memória e verdade, muitas esquecidas em caixas e ameaçadas de descarte. “Peguei os materiais que estavam mofando, selecionei o que era relevante e comecei a contatar bibliotecas especializadas em direitos humanos para doação. Era minha forma de garantir a disseminação do conhecimento”, conta. Ela chegou a levar livros para casa por receio de que fossem retirados das prateleiras. “O livro físico, uma vez descartado, não volta. Então era preciso proteger”, explica.
Ela defende a importância da disseminação da informação, do acesso à produção de conhecimento e da preservação dos registros documentais como forma de assegurar os direitos humanos. “A memória não é só o passado, ela é o presente”, afirma. Por isso, também destaca o desafio de garantir que as produções atuais do MDHC também sejam preservadas. “Assim como garimpo documentos antigos, também tento resgatar o que está sendo feito agora, porque tudo isso é parte da história que estamos construindo”, acrescenta.
A biblioteca também abriga uma biblioteca digital, fundamental para preservar resoluções de conselhos, publicações técnicas e livros temáticos sobre gênero e diversidade. Sob a gestão de Márcia, o espaço é fundamental para garantir que as publicações do ministério passem por processos de catalogação, atribuição de ISBN e sejam enviadas à Biblioteca Nacional, fortalecendo a memória institucional e o padrão de qualidade das obras.
Capitães da memória
-
- (Foto: Gabriela Matos/MDHC)
Márcia acredita que o livro teve um papel fundamental em sua trajetória pessoal e profissional. “O livro sempre foi uma questão de oportunidades”, afirma. Quando leu Capitães da Areia, de Jorge Amado, pela primeira vez, teve a sensação de ser transportada para outro mundo — não um mundo estrangeiro, mas um Brasil que ela, mineira de origem humilde, ainda não conhecia. Era a potência do livro enquanto portal: janela e espelho, descoberta e encontro.
Hoje, em um mundo dominado pela informação instantânea, ela reconhece os desafios de manter viva essa relação com a leitura profunda, reflexiva, cuidadosa. A avalanche de conteúdos nas redes sociais oferece volume, mas nem sempre profundidade. “A gente está quase tão desinformado quanto há 50 anos”, arrisca. “Antes, não tínhamos acesso. Hoje, temos um mundo inteiro na palma da mão, mas não conseguimos acessar o que realmente importa.”
Ainda assim, ela acredita que há espaço para o livro. “Sempre vai ter um tempo para que as pessoas leiam”, afirma. Desde que haja incentivo; que a educação forme leitores críticos; que as novas gerações aprendam a confiar no conhecimento referendado, elaborado com rigor, como o que se encontra em um artigo científico, numa obra literária, numa boa biografia.”
-
- (Foto: Divulgação)
A escritora e jornalista paraibana Waleska Barbosa acredita que o acesso e a garantia à cultura em todos os espaços e territórios são elementos essenciais para uma vida digna. “Como escritora e idealizadora de um coletivo que incentiva a literatura de autoria feminina negra, o Julho das Pretas que Escrevem no DF, acredito que escrever e ter a possibilidade do acesso à leitura são ferramentas potentes para o autoconhecimento e o conhecimento do outro e do entorno”, comenta.
Para ela, em um mundo onde a tecnologia tem mediado as relações e já não parece ser tão fácil discernir a realidade do artificial, a cultura pode – e deve – atuar como antídoto, respiro e possibilidade de mudança.
Neste 23 de abril, Dia Mundial do Livro e dos Direitos Autorais, o MDHC reafirma seu compromisso com o acesso à leitura e à preservação da memória histórica do país, e celebra o trabalho incansável de profissionais como Márcia Rocha, que compreendem que livros não são apenas fonte de conhecimento, mas também instrumentos de luta por dignidade e cidadania para todas as pessoas.
Fonte: Agência Gov